Livro: Mário: episódios das lutas civis portuguesas de 1820-1834

Fonte: Jogo do Pau Português
capa do livro


Sobre

  • Relevância: ★★☆
  • Título: Mário: episódios das lutas civis portuguesas de 1820-1834
  • Autor: Antonio Silva Gaio (Dr.) (1830-1870)
  • Publicação: Imprensa Nacional, 1868
  • Formato: Capa Dura de Alfredo Moraes, 463 páginas


Com uma introdução do Dr. Joaquim Ferreira. Publicou apenas um romance, Mário, que relata as lutas entre liberais e absolutistas, inserindo-se na corrente romântica, com influências de Alexandre Herculano e Camilo Castelo Branco.

Excertos da obra

« Traz camisa de linho, com peitos bordados; collete de côr viva, com botões de vidro azul; jaqueta sobre o hombro esquerdo; mangas da camisa estreitamente apertadas nos pulsos; facha de lã vermelha , calça de saragoça entrefina, e sapatos de sola grossa, e bem cravada com brocha de cabeça larga. Grande pau de marmeleiro; chapéu desabado, com roseta enorme, e grande fita, cujas pontas caem para fóra das abas, ao desdem. É o melhor guia para os pontos culminantes da serra, valente e bom rapaz; joga o pau com perfeição, dansa bem, canta melhor, e ao desafio , se tem adversario. É , emfim , o espinho das raparigas de boas tres leguas em redondo. » (pág.235)

« Esses disfarces não pegam, diz o indiscreto espectador, homem alto e folgasão, encostado a comprido pau de choupa.
- Vá! vá! clama o mouro. Então esses ferrinhos estão de quedo? E essa viola ?
- Venha cá para dentro, Sr. Miguel, diz, anhelante, e dansando sempre, a Joaquina, ao homem que lhe gabou o donaire, a ver se lhe prende a lingua.
- Já não tenho com quem danse, rapariga!
- Olhe, a Josefa.
- Dizes bem. Salta cá, Josefa! Já ambos somos casados, mas ainda se vae mostrar o que é dansa. Eh! Ó Manel, empresta cá a viola. Guarda-me esse pau, Caetano! » (pág.236)

«(...) Os amigos de Joaquim levantaram os cajados, e emquanto Marcos pegava no seu, que um rapaz lhe estendia, caiu-lhe sobre os hombros violenta pancada.
- Façam campo! bradou elle com o pau já em posição, e crescendo para os homens.
A este, um açoite que o tombou; aquelle uma pontuada no peito, que lhe fez largar o cajado; e com rapido sarilho foi repellindo os inimigos que batiam em falso.
- Estás a geito! disse Marcos de repente, estendendo uma pancada de boa vontade, sobre Joaquim, que foi, redondo, ao chão.
Mas aos amigos d'este juntaram-se uns, aquelle, uniram-se outros, e em pouco tempo se tornou encarniçada a luta, e geral a confusão.(...)
- É o Antonio Marcos que já varreu a Senhora das Febres! clamavam as vozes do partido de Holofernes.
- Fujam! Fujam! bradavam os partidarios de Marcos. São os homens do sr. Jorge Pinto!
- Pois levam hoje coça mestra! respondeu um mocetão, cuspindo nas mãos para melhor segurar o cajado de carvalho.
A elles, rapazes! A elles! Antonio ía na frente do seu bando, agil e dextro, varrendo effectivamente quanto achava diante. Ora se abaixava, e cobria cabeça e hombros, com o pau horisontalmente collocado; ora saltava para trás, ou para os lados; ora resaltava para a frente , quando o seu adversario, do momento, tinha os braços dormentes, de haver batido no chão, e o castigava então rijamente . » (pág.242)

« Na roda dos dançadores, quis entrar Joaquim, o criado de Jorge Pinto.

-Lá para fora! bradou António Marcos, de sobrolho carregado.
-Eu já tenho parceira, replicou aquele.
-Mal empregada! Vá dançar onde quiser! Aqui não dança você!
-Então quem manda!
-Mando eu, e mais este marmeleiro. Não dançam aqui homens com mortes às costas!

Joaquim retirou-se furioso, e meio apupado pelos espectadores.

-Venha a viola! disse o Marcos. A isto, rapazes!

Começou a dança. Os pares eram novos, alguns eram namorados, e todos andavam numa festa, que os ditos de fora, e as respostas, de dentro, mais animavam.

-Faz-me berrar essa rebeca, João! Parece que estas ai a morrer!!
-Bravo! Bravo! chamavam os de fora.

A alegria era viva e não disfarçada; e havia talvez meia hora, que não paravam os dançadores.

(...) Uma bofetada interrompeu o provocador.

Os amigos de Joaquim levantaram os cajados, e enquanto Marcos pegava no seu, que um rapaz lhe estendia, caiu-lhe sobre os ombros uma violenta pancada.

-Façam campo! bradou ele com o pau já em posição, e crescendo para os homens.

A este, um açoite que o tombou, àquele uma pontuada no peito, que lhe fez largar o cajado; e com rápido sarilho foi repelindo os inimigos que batiam em falso.

-Estás a jeito! disse Marcos de repente, estendendo uma pancada de boa vontade, sobre Joaquim, que foi, redondo, ao chão.

Mas aos amigos deste juntaram-se uns, àquele, uniam-se outros, e em pouco tempo se tornou encarniçada a luta, e geral a confusão.

As mulheres pediam, em altas vozes, aos homens, que por diversos títulos lhes pertenciam, que se não metessem na desordem.

Os velhos, com a mão esquerda sobre o chapéu, para que não caísse na carreira, fugiam da batalha.

Os pequenos levantavam gritaria infernal.

-Fujam! Fujam! bradava um ricasso, de chapéu braguês, calção e polaina, e casaca de abas muito curtas, correndo desorientado no meio da desordem.
-É para aqui, sr. Bráz! lhe gritava voz compadecida. Para ai, não!

O sr. Bráz corria sempre! Parou de vez, quando lhe caiu em cima, pancada sem dono, à qual nem o braguês pôde resistir!

-É o António Marcos que já varreu a Senhora das Febres! clamavam as vozes do partido de Holofernes.
-Fujam! Fujam! bradavam os partidários de Marcos. São os homens do sr. Jorge Pinto!
-Pois hoje levam coça mestra! respondeu um mocetão, cuspindo nas mãos para melhor segurar o cajado de carvalho.

A eles, rapazes! a eles!

António ia na frente do seu bando, ágil e destro, varrendo efectivamente quanto achava diante. Ora se abaixava, e cobria a cabeça e ombros, com o pau horizontalmente colocado; ora saltava para trás, ou para os lados; ora ressaltava para a frente, quando o seu adversário, do momento, tinha os braços dormentes, de haver batido no chão, e o castigava então rijamente.

-Homens! gritou o doutor de cima de uma pedra. Tenham lá mão! Está aqui gente sossegada, e estou eu também!!
-Nossa Senhora das Merçês! clamava, em sons de flautim, a mulher do sr. Lourenço.
-Homens! Então? Vocês estão doi…

O doutor não pôde acabar, porque uma onda de fugitivas mulheres, atropelando a numerosa família, o deitou por terra!

-Acudam! Nossa Senhora da Graça!

A onda passou, e o doutor envergonhado da sua pouca fortuna, levantou-se, esfregou um cotovelo, e pôs os beiços em pasmosa saliência.

-É para baixo!! gritou ele animando os que levavam de vencida os amigos de Joaquim.

António Marcos chegou ao pé da igreja, quando dela saia o vigário.

-Que é isto, António? Tu vens fazer desordens à romaria?
-Perdoe, meu padrinho!

E contou em voz alta a origem da luta.

» (pág.240-243)

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