Artigo: Mapa - Jogo do Pau 2016

Fonte: Jogo do Pau Português
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Sobre

  • Relevância: ★★☆
  • Título: Jogo do Pau
  • Autor: Bruno Afonso e Frederico Martins
  • Publicação: Artigo em «Jornal Mapa» nº 12 de fevereiro-abril 2016

Artigo

« Até ao início do séc. XX era essencial saber jogo do pau. Era uma questão de sobrevivência, de vida ou de morte. Sem guardas nem policias, as pessoas no interior do país tinham de se conseguir defender de ladrões e animais selvagens, viajando de freguesia em freguesia, entre serras e montes, assim como nas lutas e confrontos pessoais com gentes de outras aldeias. O jogo do pau é uma arte marcial portuguesa que durante séculos se desenvolveu essencialmente no norte de Portugal, nas zonas rurais do Minho e Trás-os-Montes, e um pouco pelo sul da Galiza. Eram outros tempos. No livro "A Arte do jogo do pau", de 1886, Joaquim António Ferreira escreve: "Quando de noite me retirar dalguma casa, darei, á sahida da porta, uma pancada forte na soleira, sempre coberto com o meu pau para evitar alguma traição." "Quando tambem de noite, fôr bater a qualquer casa, pegarei no meu chapéo e põl-o-hei na ponta do meu pau; e, assim que se me abrira porta, darei uma passada forte, e ao mesmo tempo mette-rei o pau adiante com o chapéo em cinza; se casualmente vier alguma pancada, apanha-la-ha o chapéo e não a minha cabeça." Podemos aqui ver como seria viver na época. Com o perigo latente, sempre presente. No norte de Portugal um homem nunca saía de casa sem levar o seu pau. "Vivia-se num estado em que as agressões e os ataques eram sempre de recear."


O VARAPAU

Na época, o pau, ou varapau, fazia parte da indumentária do homem do campo. Era usado como apoio nas deslocações, ou como arma quando necessário.

Como o nome indica, no jogo do pau a arma usada é um pau. Uma vara com um comprimento entre 1,50cm e 1,60cm, com uma ponta mais grossa do que a outra. As madeiras mais comuns eram o marmeleiro, freixo, carvalho, castanho e lódão — sendo que a favorita é o lódão, pela sua resistência e flexibilidade. "O rapaz tinha-se por moço quando arranjava o seu varapau e ia de ronda com os outros; era assim como ser armado cavaleiro." Na época, o pau, ou varapau, fazia parte da indumentária do homem do campo. Era usado como apoio nas deslocações, ou como arma quando necessário. Podemos supor que o manejo do pau, o seu uso e aperfeiçoamento como arma de combate, foi um desenvolvimento natural contra os perigos que o rodeavam. O varapau sempre acompanhava o homem. Se o homem ia a pé, o pau ia na mão. Se ia de cavalo, o pau transportava-se debaixo de uma perna, pronto para ser usa-do. O varapau "só se largava de mão enquanto o moço conversava com a sua moça na lareira da casa desta, então o pau ficava à porta, para indicar aos outros que nada tinham que fazer ali."

HISTÓRIA

O jogo do pau reinou em Portugal durante séculos, mas os registos antigos são poucos e vagos, mas sempre presentes na história portuguesa. Em 1438, o rei D. Duarte I escreveu "En-sinança de Bem Cavalgar Toda Sela", um dos registos mais an-tigos que se encontra com a técnica usada no jogo do pau. Os 'caceteiros' do rei D. Miguel durante a Guerra Civil Portugue-sa (Guerra Miguelista ou Guerra dos Dois Irmãos), em 1828, eram jogadores do pau. Mas eram ho-mens pagos para bater noutros homens por motivos políticos, a troco de dinheiro. "Batiam em gente geralmente indefesa, com o objectivo de causar terror e calar os opositores de quem lhes paga-va." Diziam que um "caceteiro" dá cacetadas, não joga ao pau. Durante as invasões francesas em Portugal, as guerrilhas do norte, esses camponeses norte-nhos, guerreiros de foices e vara-paus na mão, tiveram um papel muito importante na vitória por-tuguesa. "Adeus, meu Napoleão,1 Que é quasi nzeia-noitedAchaste em Portugal/Quem te désse mui-to açoite" — Raul Brandão Em 1916 Portugal entrou na Primeira Grande Guerra. Muitos homens minhotos e transmontanos fo-ram enviados para a guerra das trincheiras, e com eles foi a arte do jogo do pau. Era uma vanta-gem grande. Deram-se bem no manejo da baioneta e na luta das trincheiras, corpo a corpo. "O sargento Américo Pelotas, co-mandando em Lacouture, uma patrulha de reconhecimento, vé cair todos os seus homens ceifados pelas metralhadoras; fica só ele, de pé, defendendo-se de seis alemães que o atacam à baioneta; destro jogador de pau, varre-os, como numa feira; quatro mordem a ter-ra; dois fogem; e quando o valente regressa à trincheira, vitorioso, o tiro certeiro de um sniper prostra--o para sempre." (O heroismo, a elegância, o amor - O Mosteiro da Batalha - Júlio Dantas, 1923) "Um exército? Mas ele não preci- sa de um exército além do vara-pau, do burro e do cão. O varapau varre uma feira, tão eficazmente como um canhão krupp" (As Ale-gres Cançáes do Norte — Alberto Pimentel) ESCRITORES E CONTOS Sendo o jogo do pau uma arte essencialmente rural, quem sabia lutar não sabia ler nem escrever. O conhecimento passava pelo treino e pela prática, pela neces-sidade. Muitos mestres viviam exclusivamente do ensino, caval-gando de aldeia em aldeia, de re-gião em região. Para prolongarem os dias das liçáes guardavam para si certas técnicas, certos segredos, de forma a terem sempre mais al-guma coisa a ensinar, num dia di-ferente. Mas se estivessem numa freguesia diferente da sua, os mestres escondiam o seu conhe-cimento, dando assim vantagem à sua aldeia em caso de confronto. Existia uma tradição oral na tro-ca de informações, mas não ha-via notas nem manuais. Tudo isto ajudou a que muito se per-desse. Neste sentido, o séc. XIX e início do séc. XX foram glo-riosos, com escritores como Aquilino Ribeiro, Miguel Torga, Camilo Castelo Branco, Eça de Queirós, etc., a escreverem so-bre o assunto e a incluírem o jogo do pau nos seus romances. " Camilo de Noronha, que, já neste século foi notável como toureiro e varredor de feiras. A sua destreza no fogo de pau era tal, que che-gava a um arraial, apeava e des-troçava a multidão, atirando ho-mem por terra como uma criança que derrota um regimento de sol-dadinhos de chumbo." (O Conde d'Abranhos- Eça de Queirós 1925) TREINAR A SÉRIO. A única forma que tinham de treinar era jogando a sério, con-tra pessoas de outras aldeias, pessoas com outra arte, com técnicas diferentes. "Já os anti-gos diziam que pancada à perna não faz mossa, não mata. Pan-cada na cabeça já é outra coisa." Uma vez, num almoço com o mestre Nuno Russo, ouvi a his-tória do que se fazia para treinar contra outra gente. O jogador ia de cavalo até uma aldeia vizi-nha e dava 2 tostões a um MOÇO para lhe guardar o cavalo à saí-da da aldeia. Então o homem ia a pé até uma tasca, bebia uns copos de vinho tinto e arranja-va uma discussão com alguém. Na meio das palavras erguia o varapau e iniciava a luta. Estes combates eram geralmente le-vados em desvantagem numé-rica, onde um homem lutava contra vários ao mesmo tempo. Quando oceano apertava de-masiado ou quando o homem se cansava, ele dava uma pi-rueta com umas varrimentas para o lado, abrindo um bu-raco no meio do cerco, e fu-gia na direcção do cavalo. Eram treinos arriscados. Pu-nham a sua vida em perigo. Mas não havia outra forma de o fazer. Muitas vezes, membros de al-deias rivais apareciam nas festas

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