Livro: O Malhadinhas: diferenças entre revisões
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E Deus fale na alma do Chico Pedreiro, de | E Deus fale na alma do Chico Pedreiro, de Ermesinde, que veio da sua terra para a nossa erguer paredes e, começava eu a espigar, ia para trás do cemitério ensinar-me a jogar o pau! Apanhei muita negra nas mäos e nos braços, mas, honra lhe seja, aprendi o manejo todo. | ||
Ermesinde, que veio da sua | |||
Graças a ele e à presença de Rita, que me incutia vontade de ser homem, pude varrer aquela desfeita com brio! O Chico Pedreiro era a alma | |||
dum jogador! Dois homens a atirar-lhe pedras, as pedras a choverem umas atrás das outras por cima dele, e ele parava-as só com o pau. | |||
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E, notei, täo imprevisto lhe era que, se quisesse aos primeiros passes despachá-lo com uma pontoada, fazia-o täo certo como ter sido meu mestre nesta arte o maior jogador do Minho. Já os olhos de Rita se alegravam e me pareciam estorninhos a saltaricar num jardim. (...) | |||
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Defendendo-se à navalhada e golpes de pau (e por vezes a tiro) dos inimigos com que se foi deparando ao longo dos caminhos e da vida, Malhadinhas confessa: | Defendendo-se à navalhada e golpes de pau (e por vezes a tiro) dos inimigos com que se foi deparando ao longo dos caminhos e da vida, Malhadinhas confessa: |
Edição atual desde as 19h12min de 4 de maio de 2025
Sobre
- Relevância: ★★☆
- Título: O Malhadinhas
- Autor: Aquilino Ribeiro (1885-1963)
- Publicação: 1ª publicação na Coletânea A Estrada de Santiago, em 1922
Inicialmente incluído em Estrada de Santiago (1922), O Malhadinhas acabaria por se tornar numa das mais conhecidas obras de Aquilino Ribeiro quando foi publicado em volume autónomo em 1958 (o autor acrescentar-lhe-ia a novela Mina de Diamantes). Em forma de monólogo, a obra conta-nos a história de um almocreve, o Malhadinhas, um serrano rústico, grosseiro e matreiro, que não tem quaisquer problemas em usar a «faquinha» que traz à cintura para corrigir o que entende por injusto. Defendendo-se à navalhada e golpes de pau (e por vezes a tiro) dos inimigos com que se vai deparando ao longo dos caminhos e da vida, O Malhadinhas presenteia-nos com uma série de episódios picarescos, num tom coloquial repleto de expressões idiomáticas, trazendo-nos o retrato de um Portugal esquecido.
Excertos da obra
Segundo o livro, O Malhadinhas foi discípulo do Chico Pedreiro, de Ermesinde (que, diz-se, com o pau parava as pedradas que dois homens lhe atiravam).
« E Deus fale na alma do Chico Pedreiro, de Ermesinde, que veio da sua terra para a nossa erguer paredes e, começava eu a espigar, ia para trás do cemitério ensinar-me a jogar o pau! Apanhei muita negra nas mäos e nos braços, mas, honra lhe seja, aprendi o manejo todo. Graças a ele e à presença de Rita, que me incutia vontade de ser homem, pude varrer aquela desfeita com brio! O Chico Pedreiro era a alma dum jogador! Dois homens a atirar-lhe pedras, as pedras a choverem umas atrás das outras por cima dele, e ele parava-as só com o pau. » |
Mas, também nos diz que teve como mestre o maior jogador do Minho. Seria a tecnica Minhota, ou do Porto e o mestre andava a varrer feiras no Minho?
« E, notei, täo imprevisto lhe era que, se quisesse aos primeiros passes despachá-lo com uma pontoada, fazia-o täo certo como ter sido meu mestre nesta arte o maior jogador do Minho. Já os olhos de Rita se alegravam e me pareciam estorninhos a saltaricar num jardim. (...) » |
Defendendo-se à navalhada e golpes de pau (e por vezes a tiro) dos inimigos com que se foi deparando ao longo dos caminhos e da vida, Malhadinhas confessa:
« O Pau defendia-me de cão, de malta frente a frente, mas para jogos de falsa fé e pessoas de mau sentido não havia como uma faquinha. » |
Um dos episódios mais emblemáticos de Malhadinhas, passa-se em Santa Eulália, quando este se vê confrontado com um jogador de pau local, descrito como «(..) um varredor de feiras temível. Está para nascer o primeiro que lhe faça sombra.».
O desafiante aposta uma moeda de ouro de D. João V - que Malhadinhas dispensa caso ganhe, mas que a paga em dinheiro o seu valor caso perca – e, agarrando ao seu lódão (varapau de lódão), pede a Rita uma faca, uma navalhinha como diz, porque o intuito não será fazer mal…
Iniciado o jogo entre os dois, rodeados pela população, Malhadinhas conta, segundo as palavras de Aquilino: [1]
« (…) e à voz: é uma! é duas! é três! Só armei para receber o pimpão que caía sobre mim de pancada alta. Varri o golpe e, a tentear-lhe o manejo, comecei a parar com brandura, como a medo.(…) Tau-tau, a defender-se duma pancada ao ombro, facilitou-se-me pular-lhe ao peito, e limpei-lhe o primeiro botão, o rei. Foi tão rápido que ninguém reparou e mal me deu tempo para varrer a resposta que me mandava à cabeça.(…) Dois botões, capitão e soldado, foram à viola, um a seguir do outro, tão calados e cerces como o primeiro. E, racha contra racha, continuámos estre-loiçando.(…) (…) quando o pau dele, vergastado pelo meu, rodou por largo e desceu adormecido, que degolei o meu quarto botão, o ladrão. E obra com asseio; ninguém viu, como aliás suceda das outras vezes. O colete tinha cinco botões, faltava-me o último, o segundo rei. (…) E eu pude rematar a partida, ripando-lhe o último botão, com mais mandinga e disfarce que no jogo da vermelhinha. - Bastará? – pronunciei eu, plantando-me em meia defesa. O homem aprumou o pau, encostando-se a ele, pôs-se a limpar o suor da testa. » |
Quando o povo berra e felicita ambos os jogadores, não havendo vencedor, nem vencido, Malhadinhas interrompe:
« - Alto lá! – brandei. – Há vencedor e vencido, se é que não morreu o Direito em Portugal. Olhem bem! Afirmavam-se todos para mim, afirmavam-se depois para ele e não percebiam. - Abotoe lá o colete, camarada! – tornei eu para o mata-sete. – Abotoe-o que se lhe desabotoou. Está suado e pode apanhar uma pneumonia…
O fanfarrão ia fazer o que eu lhe indicara e, como pelo facto não encontrasse os botões, procurou-os com a vista.(…) Ficaram todos suspensos quando vieram ao entendimento completo da façanha. » |
Galeria de imagens
- Ilustrações para O Malhadinhas de «Bernardo Marques»[2]
- Outras imagens
Ver também
- Quem era o Malhadinhas ou António da Rocha Malhada
- Consulte toda a Bibliografia
Links externos
- Aquilino Ribeiro – Wikipédia
- Consulte no Google onde pode comprar este livro
- Etnografia de Aquilino Ribeiro por José Manuel Sobral
Referências
- ↑ LOPES, Paulo, O Jogo do Pau Português, 5livros, 2020 (sobre o livro)
- ↑ Ilustrações para o Malhadinhas no Museu Calouste Gulbenkian