Anónimo

Armas Medievais e o Jogo do Pau Português

Fonte: Jogo do Pau Português

ARMAS MEDIEVAIS E JOGO DO PAU PORTUGUÊS

(Histórico-Antropológicas)

Texto escrito pelo Mestre Hélder Valente


A técnica básica do Jogo do Pau Português, está subjacente em todas as armas antigas de haste, embora, como é evidente, a sua aplicação tivesse que ser adaptada em função do tipo de armas, bem como do oponente e equipamento por ele utilizado.

Cumpre aqui aclarar, uma interessante controvérsia, que surgiu num blog, acerca de assuntos referentes ao J.P.P. e contribuir para quebrar alguns mitos que se instalaram nesta área.

A técnica do J.P.P. tem muito pouco a ver, com espadas de qualquer tipo: (Montantes; Espadas longas para duas mãos; ou de mão e meia).

Embora sejam geralmente designadas de “Montantes”, todas as espadas longas para duas mãos, o verdadeiro montante, era uma espada maior e mais pesada e foi essencialmente uma arma de apoio à cavalaria, usada por peões de brega, (briga) tinha por principal função, quebrar, ou baixar as formações de picos ou lanças, para a cavalaria poder entrar. Deveriam ser manuseados por homens fortes e rápidos, usando movimentos amplos, bem apoiados, em varrimentas cruzadas de cima para baixo, de modo a quebrar os picos ou a baixa-los em direcção ao solo.

Sabe-se que soldados mercenários alemães, durante sec. XVI, serviam em vários exércitos na Europa e que carregavam os “Zweihander”, eram designados por “Doppelsolders”, porque recebiam pagamento a dobrar devido ao seu trabalho ser muito arriscado.

As Espadas grandes para duas mãos, ou para mão e meia, que por essa altura eram usadas em duelos, funcionavam principalmente de ponta, como se pode constatar pelas gravuras que ilustram os tratados medievais, e pelas reconstituições históricas, feitas pelas escolas Europeias que estudam e descodificam os velhos tratados de armas antigas, como os nossos amigos Galegos da A.G.E.A.,( http://www.ageaesgrima.com ) essas técnicas, devido ao peso e comprimento da arma, teriam de ser “económicas”, assentavam essencialmente num jogo de pontas altas, com movimentos pouco amplos, quase lineares, de jogo breve e preciso, em que se procurava o contacto quase permanente das lâminas coladas, que os Alemães designam por “Binden” (jogo da lâmina ligada) e os Galegos por “Morder de folhas”, é um jogo fundamentalmente com folhas conectadas, de modo a que após ligeiro desvio da arma adversária, a ponta da nossa arma fique o mais perto possível do alvo.

Portanto isto tem muito pouco a ver com a riqueza e amplitude de movimentos do nosso Jogo do Pau. Claro que usavam também movimentos de grande amplitude, (corte) como no J.P.P. mas essa não era a Técnica Básica das Espadas Antigas, num duelo de morte.

O Jogo do Pau e as Armas Metálicas, tiveram evoluções distintas. Outro mito repetido, é a alusão ao livro do Rei D.Duarte; “Livro da Ensinança de Bem Cavalgar toda Sela”, No Capítulo XIII, intitulado : Da maneira de ferir de Spada, o Rei escreve:

(“-a mym parece que razoadamente a cavalo se pode ferir de quatro maneiras: Primeira, de talho travesso. Segunda, de revez. Terceira, fendente de cima pera fundo. Quarta, de ponta… Mais adiante o Rei refere mais um golpe: envyees, pera fundo.”) esta é a única alusão que o Rei faz aos nomes dos golpes.

Embora seja fácil perceber quais as tragetórias dos ataques; os nomes empregues pelo Rei, nada têm a ver com a terminologia que nos foi passada pelos nossos Mestres Antigos, a qual não deverá ser alterada e muito menos traduzida, porque os Nomes Antigos, encerram uma “Carga ancestral”, um “Espírito próprio”.

Se os Mestres das Artes Orientais e outras, corretamente, não abdicam da sua terminologia própria, quando ensinam a estrangeiros, porque haveríamos nós de abdicar?! - Daqui a um par de gerações, adotam as nossa técnicas e já não se lembrarão mais das suas origens.

Não há necessidade de inventar ascendentes ilustres para valorizar ou dignificar a nossa Arte; Quem faz estudos comparados de jogos de pau, não tem qualquer dúvida que o J.P.P. que nos chegou até hoje, é o mais rico e eficaz de todos, apesar das diferenças de estilo existentes no País, têm todos uma base comum: (Pau de comprimento e peso optimizado para luta rápida e de alcance, guardas de lado, pega numa só ponta, ataques em rotação, a uma e duas mãos).

O Jogo do Pau é do Povo, sempre foi do Povo e d`alguma burguesia, criado, aperfeiçoado e adaptado por diferentes Mestres ao longo de gerações, criando diferentes estilos mas sempre dentro duma base comum, trazido do Norte e aperfeiçoado no Sul, nas suas diferentes vertentes por toda uma linha de Mestres até aos nossos dias.

Quando se domina a Técnica básica do J.P.P. nas suas diferentes componentes de geometria dinâmica, timing e bio-mecânica, domina-se instintivamente qualquer arma antiga, de haste longa ou curta, ocidental ou oriental.

O transfer é automático, intuitivo. A adaptação à arma em função das características desta; comprimento, peso e capacidade contundente (tendo sempre em conta o tipo de oponente e seu equipamento) torna-se natural e lógico.

Não há aqui nada de científico.

Quem pratica ao ponto de compreender e automatizar o J.P.P., o transfer para as outras armas de haste é natural e instintivo. Para terminar deixaria uma mensagem para os “amantes” do Jogo do Pau Português:

“Procurai primeiro estudar e praticar o J.P.P. até à incorporação do seu espírito e a melhor técnica de todas as outras armas, vos será dada por acréscimo”.

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