Livro: A Triste Canção do Sul: diferenças entre revisões

Fonte: Jogo do Pau Português
 
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== Sobre ==
== Sobre ==


* '''Relevância: ''' ★★☆
* '''Título:''' A Triste Canção do Sul
* '''Autor:''' Alberto Pimentel
* '''Autor:''' Alberto Pimentel
* '''Publicação:''' Lisboa: Livraria Central de Gomes de Carvalho, 1904
* '''Publicação:''' Lisboa: Livraria Central de Gomes de Carvalho, 1904
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Na rua, as manifestações e a cultura popular misturavam-se, dando origem às letras anarco-sindicalistas no meio fadísticos.
Na rua, as manifestações e a cultura popular misturavam-se, dando origem às letras anarco-sindicalistas no meio fadísticos.


No ano anterior, a ''História do Fado'' tinha saído para as estantes, à qual se seguiu ''A Triste Canção do Sul''.
No ano anterior, a ''História do Fado'' tinha saído para as estantes, à qual se seguiu '''''A Triste Canção do Sul'''''.


Desta vez foi o historiador académico que ganhou ao jornalista: ''Pimentel'' valorizou as citações de outros autores em detrimento da vivacidade do estilo e da narrativa de ''Pinto de Carvalho''.
Desta vez foi o historiador académico que ganhou ao jornalista: ''Pimentel'' valorizou as citações de outros autores em detrimento da vivacidade do estilo e da narrativa de ''Pinto de Carvalho''.
<ref>Sinopse feita pela livraria [https://www.wook.pt/livro/a-triste-cancao-do-sul-alberto-pimentel/21188019 Wook]</ref>
<ref>Sinopse feita pela livraria [https://www.wook.pt/livro/a-triste-cancao-do-sul-alberto-pimentel/21188019 Wook]</ref>


== Excerto da obra ==
== Excertos da obra ==
 
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«(...) Não ha senão uma defeza para o modo como elle aggride: o tiro ou a '''''bengala, quando esta seja manejada por um jogador estremamente destro'''''.(...)
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Outro eximio cantador do Fado foi o ''Pitalcante''<ref>Terá chegado a frequentar o Conservatório de Lisboa, sendo o primeiro fadista identificado com formação musical académica. Entusiasta pela tauromaquia, grande aficionado.</ref>, filho do famoso '''jogador de pau''' que se chamou ''[[Mestre: José Maria da Silveira|José Maria Saloio]]''.
<ref>O autor referencia o livro ''[[Livro: Os excêntricos do meu tempo|Os excêntricos do meu tempo]]'', de ''Luís Augusto Palmeirim'', 1891, p.263</ref>
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O historiador relata uma história de dois jogadores de pau, o ''[[Conde de Vimioso]]'' e o seu amigo João Nunes Vizeu:
O historiador relata uma história de dois jogadores de pau, o ''[[Conde de Vimioso]]'' e o seu amigo João Nunes Vizeu:
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Foi por occasião da feira do Campo Grande.<br>
Foi por occasião da feira do Campo Grande.<br>
Dois valentões da província tinham se postado junto ao portão de ferro, que então limitava o Campo Gran- de pelo lado do Lumiar, e não deixavam entrar nem sair ninguém.
Dois valentões da província tinham se postado junto ao portão de ferro, que então limitava o Campo Grande pelo lado do Lumiar, e não deixavam entrar nem sair ninguém.


A que distancia já ficam hoje estas bravas tunantadas portuguezas, e que mal se podem comprehender agora!
A que distancia já ficam hoje estas bravas tunantadas portuguezas, e que mal se podem comprehender agora!
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Todos estes predicados davam prestigio, faziam lenda ao conde no conceito popular. Pode imaginar se a ovação de que elle seria alvo n'aquella manhã do Campo Grande, quando varreu os dois alcides que varriam a feira.
Todos estes predicados davam prestigio, faziam lenda ao conde no conceito popular. Pode imaginar se a ovação de que elle seria alvo n'aquella manhã do Campo Grande, quando varreu os dois alcides que varriam a feira.
<small>(pp.173)</small>
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Fado Saloio:
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Sou saloio, honro-me d'isso,<br>
P'ra casacas não sou mau;<br>
Os janotas atrevidos<br>
'''''Sei correr a varapau.''''''<br>
Que andamos no ramerrão<br>
Dizem lá os de Lisboa;<br>
Porém entre nós já sôa<br>
O brado da illustração:<br>
Escolas já cá estão<br>
Fazendo bello serviço;<br>
Eu cá já lenho toutiço<br>
Para entender os jornaes,<br>
Tenho ideias liberaes,<br>
Sou saloio, honro-me d'isso.<br>
Aos comícios vou tambem<br>
E lá sei fallar em barda<br>
Contra quem mo põe albarda,<br>
E nos deixa sem vintém:<br>
É certo que não vou bem<br>
Com quem se me faz marau;<br>
Mas jamais corro a calhau<br>
Quem me sabe respeitar;<br>
Se não vêem cá namorar<br>
''P'ra casacas não sou mau.''<br>
P'r' as madamas que cá vêem<br>
Com o fim de tomar ares,<br>
Temos modos singulares<br>
E attenções como ninguém;<br>
Nós cantamos muito bem<br>
Os doces fados corridos;<br>
D'amor mil versos sentidos<br>
Sabemos improvisar.<br>
E com elles castigar<br>
''Os janotas'' atrevidos.<br>
E saiba qualquer senhor<br>
Que eu, saloio esperto e girio,<br>
Não soffro manguem co'o eirio<br>
A que tenho tanto amor:<br>
Se vem com ar zombador<br>
Algum janota marau<br>
Fazer o serviço mau<br>
De quem a crença me ataca,<br>
Verá como eu um casaca<br>
'''''Sei correr a varapau'''''<br>
<small>(pp.124-125)</small>
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O autor transcreve quatro Fados compostos em calão. Onde em um deles, o cocheiro é o ''jogador de pau''.
No livro ''[[Livro: Historia do fado|Historia do fado]]'' são referenciados alguns fadistas de renome, que além de cocheiros eram jogadores de pau. Será daí a ligação do calão ''jogador de pau'' para cocheiro?
«(...)houve alguns fadislões de renome. Citaremos (...) o cocheiro António Carapinha e o cocheiro Bitaculas, um batedor e um valente, pai dos actuais cocheiros Bitaculas.(...)»
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(...)<br>
''Arames'' é o dinheiro;<br>
Ao vinho chamam ''briol'';<br>
Ao apito um ''rouxinol'';<br>
'''''Jogador de pau''''', cocheiro;<br>
Um bêbado é um ''archeiro'',<br>
Um ''gabinardo'' um gabão,<br>
Dois vinténs um ''buzilhão'',<br>
''Avésa' quer dizer lem:<br>
Quem os não percebe bem,<br>
''Té perde a mastreação''.
(...)<br>
<small>(pp.94)</small>
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== Ler o livro ==
Pode ler toda a obra directamente na [https://archive.org/details/tristecanodo00pimeuoft/ Internet Archive]
ou fazer o download do [https://ia802700.us.archive.org/15/items/tristecanodo00pimeuoft/tristecanodo00pimeuoft.pdf PDF] (10.8Mb)
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== Ver também ==
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Edição atual desde as 20h23min de 7 de julho de 2023

capa do livro

Sobre

  • Relevância: ★★☆
  • Título: A Triste Canção do Sul
  • Autor: Alberto Pimentel
  • Publicação: Lisboa: Livraria Central de Gomes de Carvalho, 1904
  • Formato: 320 páginas


1904. Lisboa agitava-se com o Ultimato Inglês e com a polémica dos adiantamentos à Casa Real.

Na rua, as manifestações e a cultura popular misturavam-se, dando origem às letras anarco-sindicalistas no meio fadísticos.

No ano anterior, a História do Fado tinha saído para as estantes, à qual se seguiu A Triste Canção do Sul.

Desta vez foi o historiador académico que ganhou ao jornalista: Pimentel valorizou as citações de outros autores em detrimento da vivacidade do estilo e da narrativa de Pinto de Carvalho. [1]

Excertos da obra

«(...) Não ha senão uma defeza para o modo como elle aggride: o tiro ou a bengala, quando esta seja manejada por um jogador estremamente destro.(...) (p.48) »

Outro eximio cantador do Fado foi o Pitalcante[2], filho do famoso jogador de pau que se chamou José Maria Saloio. [3] (p.48) »

O historiador relata uma história de dois jogadores de pau, o Conde de Vimioso e o seu amigo João Nunes Vizeu:

« (...)as classes populares adoravam o Conde de Vimioso, que as tratava sem preoccupaçoes hierarchicas, e que se distinguia pela exteriorisação de qualidades que muito deslumbram o critério pouco intellectual do povo: a valentia, a coragem, o primor da guitarra e do toureio.(...)

Foi por occasião da feira do Campo Grande.
Dois valentões da província tinham se postado junto ao portão de ferro, que então limitava o Campo Grande pelo lado do Lumiar, e não deixavam entrar nem sair ninguém.

A que distancia já ficam hoje estas bravas tunantadas portuguezas, e que mal se podem comprehender agora!

Raça de Hercules, no acerto ou na loucura, quebra- mos: agora estamos a pedir funda. O povo levantou celeuma contra os dois pimpões, mas não ouzava affrontalos, porque algum saloio que investia, recuava ganindo, deslombado.

Com o Conde de Vimioso estavam almoçando n'essa occasião o sr. Miguel Queriol e João Nunes Vizeu. Ouviram o borborinho que vinha da alameda, informaram-se da occorrencia, e não tiveram um momento de hesitação.

Narra o sr. Queriol, sem faltar de si mesmo, mas certamente que não deixou de molhar a sua sopa, porque era muito desembaraçado :

« O conde de Vimioso e José Vizeu apenas tiveram tempo de cada um se munir de bons cajados de marmaleiro, e fazendo frente aos dois varredores de feiras os levaram a tombos até junto da feira, onde os soldados municipaes os receberam contusos e confusos da má sorte que em Lisboa veio offuscar a sua valentia provinciana.»

Todos estes predicados davam prestigio, faziam lenda ao conde no conceito popular. Pode imaginar se a ovação de que elle seria alvo n'aquella manhã do Campo Grande, quando varreu os dois alcides que varriam a feira. (p.173) »

Fado Saloio:

Sou saloio, honro-me d'isso,
P'ra casacas não sou mau;
Os janotas atrevidos
Sei correr a varapau.'

Que andamos no ramerrão
Dizem lá os de Lisboa;
Porém entre nós já sôa
O brado da illustração:
Escolas já cá estão
Fazendo bello serviço;
Eu cá já lenho toutiço
Para entender os jornaes,
Tenho ideias liberaes,
Sou saloio, honro-me d'isso.

Aos comícios vou tambem
E lá sei fallar em barda
Contra quem mo põe albarda,
E nos deixa sem vintém:
É certo que não vou bem
Com quem se me faz marau;
Mas jamais corro a calhau
Quem me sabe respeitar;
Se não vêem cá namorar
P'ra casacas não sou mau.

P'r' as madamas que cá vêem
Com o fim de tomar ares,
Temos modos singulares
E attenções como ninguém;
Nós cantamos muito bem
Os doces fados corridos;
D'amor mil versos sentidos
Sabemos improvisar.
E com elles castigar
Os janotas atrevidos.

E saiba qualquer senhor
Que eu, saloio esperto e girio,
Não soffro manguem co'o eirio
A que tenho tanto amor:
Se vem com ar zombador
Algum janota marau
Fazer o serviço mau
De quem a crença me ataca,
Verá como eu um casaca
Sei correr a varapau
(pp.124-125)

O autor transcreve quatro Fados compostos em calão. Onde em um deles, o cocheiro é o jogador de pau.

No livro Historia do fado são referenciados alguns fadistas de renome, que além de cocheiros eram jogadores de pau. Será daí a ligação do calão jogador de pau para cocheiro?

«(...)houve alguns fadislões de renome. Citaremos (...) o cocheiro António Carapinha e o cocheiro Bitaculas, um batedor e um valente, pai dos actuais cocheiros Bitaculas.(...)»

(...)
Arames é o dinheiro;
Ao vinho chamam briol;
Ao apito um rouxinol;
Jogador de pau, cocheiro;
Um bêbado é um archeiro,
Um gabinardo um gabão,
Dois vinténs um buzilhão,
Avésa' quer dizer lem:
Quem os não percebe bem,
Té perde a mastreação. (...)
(pp.94)

Ler o livro

Pode ler toda a obra directamente na Internet Archive ou fazer o download do PDF (10.8Mb)

Ver também

Referências

  1. Sinopse feita pela livraria Wook
  2. Terá chegado a frequentar o Conservatório de Lisboa, sendo o primeiro fadista identificado com formação musical académica. Entusiasta pela tauromaquia, grande aficionado.
  3. O autor referencia o livro Os excêntricos do meu tempo, de Luís Augusto Palmeirim, 1891, p.263