Livro: Almanaque Bertrand 1952: diferenças entre revisões
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Texto escrito por ''José Maria Gaspar''. | Texto escrito por ''José Maria Gaspar''. |
Revisão das 16h42min de 16 de janeiro de 2023
Sobre
- Relevância: ★★☆
- Título: Almanaque Bertrand 1952
- Autor: M. Fernandes Costa
- Publicação: Livraria Bertrand Editora Brasil Améroca, Lisboa 1952
Texto escrito por José Maria Gaspar.
Excertos da obra
« (...) Depois da procissão, que passara num recolhimento impressionante, rompiam as danças, as rifas, os desafios e… arrulhavam os namoros cheios de pó e ilusões — estômago e coração a transbordar de vinho e amor. Um cantador que aludiu a um namoro… Não se sabe! Talvez. Um miúdo que roubou um púcaro duma tenda. Correrias, fritos, empurrões, “sarrabulho”; e um valente de Presa garante que o ladrão é da Portela “que é terra de ladroeira”. O que foste tu dizer! Um da Portela, que ouvira, dá o tom com uma valente cacetada: Pá… á! E começava então verdadeiramente o arraial… Cruzavam-se cacetes da Presa com os varapaus da Portela. As mulheres insultavam-se fritando, empurravam-se, descompunham-se… enquanto a refrega masculina continuava acesa, movimentada, quase sem palavra, numa cadência trágica de cacetadas, vivas e um ou outro gemido prolongado dum corpo que se estende. Que poético, meus senhores! Que lírico e bucólico panorama! Dava a impressão de que ficaria tudo raso. Desapareceram tendas, mutilaram-se coretos, evacuou-se o largo. Pelos caminhos convergiam lentamente os ranchos — cabeças atadas… e novas cantigas e novos ditos espirituosos e comentários… e o regresso a casa. Cansados, exaustos poeirosos, amachucados, aproximam-se das suas casas. Donde vens?, perguntava-se. Venho da festa!, respondia-se. E divertiram-se? Eh! isso é que foi! Bordoada de criar bicho, cacetada a rodos… mas ninguém morreu. E o barbeiro da terra tinha ainda que fazer para muitos dias, a encanar ossos e a dar pontos artificiais. Mas que romarias, que heróicas romarias do amor antigo! Quando hoje se vai e vem de camioneta às nossas romarias, de cachopas empoadas e quase despidas, de farnéis-dieta e águas medicinais, há que ter saudades das velhas romarias buliçosas do Portugal romeiro. Voltamos das primeiras romarias deste ano e sentimos, em tudo, que a Humanidade sofre, que o género humano está doente e que muita razão teve o episcopado Português em reprimir certos arraiais, certos divertimentos cujo espectáculo talvez ainda nos deixe saudades, mas cuja oportunidade — não há dúvida — deixou tetricamente de verificar-se. Somos solidários com os sofrimentos alheios. Por outro lado, fiquemos descansados, continua ainda e sempre a romaria eterna do amor, a romaria heróica do amor português — amor de Deus e dos homens — solidário com todos os povos e todos os séculos. Bendita a romaria heróica dum amor assim! » |
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