Artigo: Jogo do Pau - A arte marcial portuguesa - Ateneu 1975

Fonte: Jogo do Pau Português

Sobre

  • Relevância: ★★☆
  • Título: Jogo do Pau - A arte marcial portuguesa
  • Publicação: «Jornal Ateneu Comercial de Lisboa», Ano I (II série) nº 3 de janeiro/fevereiro 1975

Resumo

O artigo aborda o Jogo do Pau como uma antiga técnica de luta portuguesa onde a sua origem remonta há tempos ancestrais, e que os Lusitanos adaptaram o uso quotidiano do pau como uma forma de combate. Indica ainda, que em Portugal, esta arte marcial desenvolveu características específicas que a tornaram altamente eficaz.

Iniciado no Norte do país, o Jogo do Pau expandiu-se para outras regiões, especialmente Estremadura e Ribatejo. No século XIX, foi adotado como modalidade no Real Ginásio em Lisboa, impulsionando a sua popularidade. Diversos mestres e escolas surgiram, destacando-se o estilo peculiar do jogo praticado na capital.

Apesar de ter enfrentado um declínio no passado, o Jogo do Pau estava em 1975, a passar por um renascimento, uma vez que o mesmo era valorizado não apenas por suas habilidades de combate, mas também por seu papel na educação espiritual, psíquica e física. Houve uma mudança para uma abordagem menos violenta, mantendo a sua eficácia e sendo praticado de forma segura.

O Jogo do Pau é reconhecido como uma arte marcial que oferece benefícios para pessoas de todas as idades, promovendo saúde, agilidade e educação física. A sua prática correta é vista como um modo de aprimoramento pessoal, combinando tradição e adaptabilidade aos tempos modernos.

Artigo

« O chamado «Jogo do Pau» é urna técnica de luta em que a arma é um simples pau, direito e liso, com cerca de 1,50 m de altura, feito de madeiras apropriadas (castanho, lodo, marmeleiro, salgueiro, etc.) e tratadas especialmente para esse fim. Com esta arma, um homem pode-se defender (ou atacar) de um ou mais adversários. Em muito países como por exemplo França, Inglaterra (Ouarterstaff), Tailândia, Japão (Bo-Jiutsu), China, etc., existe uma arte de luta semelhante. Porém, em Portugal, tal arte teve urna expansão muito acentuada e revestiu-se de características muito específicas que a tornaram extraordinariamente eficaz.

A origem desta luta perde-se na noite dos tempos não se sabendo ao certo quando e onde se começou a praticar. Consta que já os Lusitanos adaptaram o pau, objecto da vida quotidiana, como arma. É de assinalar um batalhão de «caceteiros» (lutadores de pau) que quando da 2.° invasão francesa teve acção notável contra as tropas de Napoleão que tentaram atravessar o rio Minho na zona de Melgaço. Sabe-se ao certo que o JOGO DO PAU nasceu no Norte e se expandiu para o Sul, em especial Estremadura e Ribatejo. O JOGO DO PAU estava profundamente enraizado no Norte. O pau, mais que uma arma era, (e ainda o é), um companheiro inseparável do homem nortenho; com ele tacteia o caminho perigoso, de noite, a ele se apoia para saltar regatos e para percorrer os longos caminhos através das serranias. Não é pois de admirar que se tenha adaptado a arma tal Instrumento de uso corrente.

Até ao século passado o JOGO DO PAU restringiu-se ao Norte. Porém nos meados do Século XIX foi incluído como modalidade obrigatória no Real Ginásio em Lisboa, durante o reinado de D. Luís. A partir desta data começa a ganhar uma popularidade cada vez maior. Sucedem-se os mestres e jogadores notáveis. Aparecem várias escolas - os «Quintais», por vezes rivais, e dirigidos por mestres cada um com seu estilo próprio. Seguidamente o jogo do pau começou a ser ensinado em vários clubes e agremiações: Ateneu Comercial de Lisboa, Ginásio Clube Português, Lisboa Ginásio... Enfim, o jogo do pau ganha características muito próprias — o chamado jogo de Lisboa, dado que os condicionalismos que estiveram na origem desta luta, a imperiosa necessidade de salvar a vida, eram quase letra morta em Lisboa; esta desenvolveu-se aqui num sentido mais desportivo. Foi também na capital que o Jogo do Pau atingiu a sua expressão máxima, sob o ponto de vista técnico.

A partir dos princípios deste século, começa o declínio que culmina com a introdução do prática do Jogo do Pau, polo anterior regime. Na altura foram até presos vários Mestres que não se conformaram com tal proibição. Presentemente assiste-se a um renascer vigoroso desta arte.

O Jogo do Pau tem estado rodeado de um certo mistério e de tabús, marcado até por um certo barbarismo. Porém, as actuais tendências menos violentas, (mas não menos eficazes), do jogo de Lisboa têm prevalecido; porque, como já se disse, o aspecto desportivo desta arte marcial tem substituído o espírito violento dos primeiros jogadores, para os quais a mestria desta técnica era, por vezes, uma questão de vida ou morte. Como prova disto, o grande mestre que foi Frederico Hopffer, diz-nos: «Para mim não há espectáculo mais repugnante que dolo jovens companheiros e amigos, supondo que jogam o pau, atirarem mutuamente pauladas com quanta força têm, muito inconscientemente, ignorando que pode qualquer deles ficar seriamente aleijado».

Tal como outras artes marciais, o jogo do pau, quando praticado correctamente é um óptimo modo do educação espiritual o psíquica. Como meio do educação física é um excelente gozando de uma saúde o de uma agilidade espantosas poro um octogenário.

O Jogo do Pau não é de forma alguma um jogo perigoso quando bem praticado. Senão, ouçamos exercício devido à diversidade dos seus movimentos. Temos o exemplo típico do mestre Domingos Miguel que quase com 80 anos dava aulas no Ateneu e jogava com os seus alunos, de novo o Mestre Hopffer: «É praticado sem qualquer protecção especial, como sucede e é indispensável em outras esgrimas, e por isso aconselha aos jogadores mais prudência e generosidade para com adversários inferiores». O Ateneu Comercial de Lisboa é uma escola de Jogo do Pau com largas tradições. Por cá passaram grandes mestres como DOMINGUES MIGUEL, ANTÓNIO CAÇADOR e PEDRO FERREIRA, que actualmente dirige o ensino. Em tempos eram famosos os saraus e demonstrações organizados pelo Ateneu, que pretendemos fazer reviver.

É justo citar o grande contributo dado pelos Hopffer, entusiastas desta modalidade, que criaram um estilo característico, introduzido no Ateneu pelo Mestre Pedro Ferreira. »


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