Artigo: Jogo do Pau - Arte belica transformada em desporto completo - 1984

Fonte: Jogo do Pau Português

Sobre

  • Relevância: ★★☆
  • Jornal: «Gazeta dos Desportos»
  • Título: Jogo do Pau - Arte bélica transformada em desporto completo
  • Autor: Paulo Querido, e fotos de Óscar Saraiva
  • Publicação: 16 de março de 1984, página 19


Resumo

O artigo relata o Jogo do Pau como uma antiga arte de defesa e ataque que surgiu no Minho, há cerca de oitocentos anos.

Originalmente utilizado como uma técnica de defesa pessoal contra ladrões, inimigos e animais ferozes, o Jogo do Pau emigrou para Lisboa e perdeu suas características bélicas, tornando-se uma prática desportiva. No entanto, as tradições foram preservadas.

O Jogo do Pau é considerado um dos desportos mais completos no desenvolvimento físico, mas atualmente enfrenta dificuldades de implantação e reconhecimento. O jogo envolve o uso de um simples pau como arma, e as técnicas e regras foram codificadas ao longo do tempo. Existem várias escolas e associações que ensinam e promovem o Jogo do Pau, sendo o Norte de Portugal o local com maior número de escolas e praticantes. Apesar de sua rica história, o Jogo do Pau não goza da popularidade de tempos passados e possui poucos praticantes regulares.

A Associação de Jogo do Pau de Lisboa estava em 1984, empenhada na divulgação do desporto onde tinha realizado viagens e demonstrações em diferentes países. O Jogo do Pau é considerado espetacular quando jogado por jogadores avançados, proporcionando um desenvolvimento físico e mental notável. O treinamento para se tornar um jogador competente leva cerca de trinta meses, e a competição entre as escolas estava na altrura a ser planeada. Indica que os jogadores de Jogo do Pau usam faixas que indicam seu nível de habilidade e experiência, e as faixas têm raízes históricas profundas. A tradição das faixas ainda é mantida, com algumas adições para melhor quantificar o grau de experiência de cada aluno.

Artigo

« Tudo começou há oitocentos anos, no Minho. Os tempos eram duros, os caminhos difíceis. Um simples varapau constituía a melhor defesa do homem perante os ladrões, os inimigos, os animais ferozes. Na viragem deste século o Jogo do Pau emigrou para Lisboa e perdeu as características bélicas. Foi a «época de ouro» dos quintais, onde os «mestres» da arte ensinavam os jovens fazendo encontros-combate entre si. De jogo tradicional de feira e aldeia, o Jogo do Pau transformou-se em desporto, sem que se tenham perdido as tradições. Apesar de muito completo fisicamente, luta com dificuldades de implantação e reconhecimento junto do público. A destreza e perícia dos seus praticantes conferem-lhe espectacularidade e beleza plástica, patente nas fotos. A «Gazeta dos Desportos» foi saber mais sobre esta arte transformada em desporto.

O Jogo do Pau precisou de alguns séculos de actividade antes que fosse considerado por professores de educação física e médicos liga-dos à actividade desportiva como um dos desportos mais completos no desenvolvimento físico.

A sua origem remonta ao início da história portuguesa e nasceu no Minho. Era uma técnica de defesa e ataque Serviu a história nacional ao ser utilizado na revolta da Maria da Fonte, nas lutas liberais e absolutistas e contra as tropas francesas.

Mas do Minho o Jogo do Pau, também conhecido por «Esgrima Nacional» emigrou para as Beiras e mais tarde para o Sul do País. Em Lisboa, no final do século passado, o espírito tradicional do jogo afetou-se necessariamente, passando de arte bélica a arte meramente desportiva.

Afinal, o que é o Jogo do Pau? Segundo um dos mais conhecidos praticantes, Nuno Russo (do Ginásio Clube Português e membro da Associação de Jogo do Pau de Lisboa). «é simplesmente prática de uma técnica de luta tradicional portuguesa que usa como arma um simples pau».

Ainda dois dedos de conversa histórica: em Lisboa foi o Real Ginásio (hoje Ginásio Clube Português) o primeiro a introduzir a prática do Jogo do Pau, por iniciativa do Rei D. Carlos I. Depois e durante alguns anos, o Jogo do Pau foi multo popular Era a época dos «quintais», onde os «mestres» nortenhos emigrados para a capital ensinavam a arte.

Os vários quintais eram rivais e travavam lutas entre si. Muitas vezes ultrapassando o âmbito meramente desportivo...

De «luta» a desporto

Foi só a partir da fase lisboeta do Jogo do Pau que este perdeu as suas características belisticas. De combate real passou para uma adaptação desportiva e aperfeiçoada, modificada para o combate homem para homem.

Hoje, o Jogo do Pau está codificado nos seus golpes e regras, tendo perdido o carácter anárquico; estão definidas as várias «escolas», e foi criada a Associação Portuguesa do Jogo do Pau, que se transformou posteriormente em associação lisboeta. Foi levado a cabo pela AJPL todo um trabalho de pesquisa, com a ajuda do «mestre» Pedro Ferreira e da junção de todos os elementos pesquisados resultou a Escola Pedro Ferreira. Existem ainda outras «escolas», a partir dos ensinamentos e experiências de outros «mestres» do Jogo do Pau. Em Lisboa há duas escolas: a do GCP (Pedro Ferreira) e a do Ateneu. No entanto, continua a ser o Norte o sítio onde o Jogo do Pau tem maior número de «escolas» e praticantes. Fafe, Montalegre, Cabeceiras de Basto possuem escolas a funcionar em pleno. No Sul, e para além de Lisboa, há escolas na Moita e em Palmela.

Um desporto completo

Apesar destas raizes históricas profundas, o Jogo do Pau não desfruta já da popularidade de outros tempos. Numa altura em que o desporto de alta competição absorve todas as atenções do público (por vários motivos) o Jogo do Pau, que nem sequer tem uma estrutura competitiva montada, está esquecido.

Cerca de 300 e poucos jogadores de Pau no país inteiro a praticar com regularidade são os números que nos estima Nuno Russo.

Mas isso não impede que a AJPL desenvolva neste momento um enorme esforço na divulgação do Jogo do Pau. Nas recentes viagens-demonstração do GCP o Jogo do Pau foi extraordinariamente bem recebido no Japão. Em França, Nuno Russo realizou exibições bem aceites.

Espectacular quando jogado a séro por alunos evoluidos o Jogo do Pau proporciona ainda um desenvolvimento de reflexos prodigioso. Além disso, promove faculdades psicológicas como a coragem (é precisa muita...) e físicas: golpe de vista, resistência, controlo respiratório, perícia (pois envolve o domínio de um objecto estranho ao corpo que o trabalha).

Quem quiser jogar ao Pau tem em Lisboa duas alternativas: ou o Ginásio Clube Português (aulas três vezes por semana, com cerca de 20 inscritos) e Ateneu Comercial de Lisboa uma vez por semana). Um pau é barato: custa entre os 100 e os 500 escudos. O Jogo do Pau tem um uniforme especial adequado à sua prática, mas somente utilizado em demonstrações, para os treinos bastam umas sapatilhas e um fato de treino ou similar A inscrição nos clubes é que poderá ser cara...

São precisos cerca de trinta meses para se tornar um jogador do Pau competente, capaz de entrar nas «competições» entre as várias escolas, competições estas mais de treinamento, divulgação e troca de conhecimentos entre as escolas que propriamente para apurar um vencedor e um vencido.

No entanto, a competição a sério, com um sistema do pontuação próprio para se achar um vencedor, está para ser lançada pela AJPL brevemente. Neste momento, só um «mestre» podo avaliar os conhecimentos e capacidades de cada jogador — e promovê-lo ao escalão superior.

As faixas

Muitos têm comparado o Jogo do Pau português com as artes marciais importadas do Oriente. Um dos motivos desta confusão é a faixa que os jogadores de Pau, tal como os «judocas» e «karatecas, usam à cintura. No entanto, a comparação não tem razão do ser. As faixas portuguesas, têm, também elas, raízes puramente históricas. São cinco: amarela, verde, vermelha, preta e roxa, sendo esta ordem estabelecida segundo o grau e perícia do jogador.

A faixa amarela correspondia, no passado, a um principiante no jogo; era o «miúdo» que fazia a «primeira comunhão». A seguinte, a verde era retrato de uma espécie de «comunhão solene»; o seu portador já possuía alguma experiência, mas, ainda não podia envolver-se em combates com os mais velhos. A faixa vermelha marca um degrau importante, é a do «moço namoradeiro», já um jogador feito e capaz de se defender e atacar quando em combate. Recebia das mãos do «mestre» ou do pai uma vara boa, «como se fosse armado cavaleiro».

Um jogador de faixa vermelha já tinha a obrigação moral de entrar em combates pela sua aldeia. Depois temos o «homem casado», que já enverga a faixa preta. É instrutor, ajuda o «mestre» a dar as aulas, ensina aos filhos a sua arte e os seus truques. Finalmente, o «mestre»: a faixa roxa era usada apenas pelo mais competente jogador de Pau da aldeia, o «mostre», aquele cuja experiencia adquirida o levava a alcançar posição de destaque.

As faixas são ainda hoje usadas. Porque era preciso quantificar melhor o grau de experiência de cada aluno, foram incluídas «estrelas» em cada faixa, mas a tradição foi retomada e para os dirigentes da AJPL isso é o mais importante neste momento.

Associação do Jogo do Pau de Lisboa

A Associação foi primeiro fundada sub o nome de Associação Portuguesa do Jogo do Pau, em 24 de Março do 1977, por um grupo de praticantes do Ateneu. Mas em 11 de Março do ano passado passou a Associação do Jogo do Pau de Lisboa, por conveniência legal. Para além das viagens do estudo, pesquisa e divulgação pelo Norte, visitando velhos «mostres». a AJPL promoveu encontros e estágios A pesquisa, porém, ainda não acabou. A AJPL Continua a procurar todo o tipo de informações sobre o Jogo do Pau o por isso agradeço a quem lhas prestar para a sede: Av. Ressano Garcia 22, 3º Dtº 1000 Lisboa. Para os que se quiserem associar a AJPL só aceita neste momento «sócios-simpatizantes». (quota anual livre, 1000 esc. de jóia) já por inexistência do instalações próprias e condições de trabalho não se sento no direito do aceitar sócios efectivos. »


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