Bushido - Le Jeu Du Bâton – Sport Traditionnel Portugais

Fonte: Jogo do Pau Português

Bushido - Le Jeu Du Bâton – Sport Traditionnel Portugais

Texto escrito em francês pelo Mestre Nuno Russo e publicado na revista «Bushido» (ver publicação original).
Traduzido para português em 8 outubro de 2025 por Didi (Carla Cardoso)


O JOGO DO PAU
DESPORTO TRADICIONAL PORTUGUÊS

Sejam asiáticos, europeus, africanos ou americanos, todos os povos já manejaram o bastão, em todas as suas formas, longos, curtos, médios, cada etnia tendo trazido o seu génio particular ao jogo. Alguns evoluíram para o «do», outros para o desporto, mas os portugueses continuam a praticá-lo acima de tudo de forma eficaz e, hoje em dia, no seu país, os duelos ou batalhas campais não são nada raros... embora há apenas dois anos a competição desportiva tenha visto a luz do dia... introduzindo o uso de uma armadura muito semelhante à que vestem os Kendoka. Nuno Russo, responsável técnico federal, acompanhado por alguns praticantes, incluindo o atual campeão, teve a gentileza de nos demonstrar a sua arte.


I - UM POUCO DE HISTÓRIA

A designação JOGO DO PAU é uma técnica de luta em que a arma é um simples bastão reto e liso, da altura aproximada de um homem e manuseado adequadamente por cada um dos combatentes, que tenta, por um lado, defender-se dos golpes do(s) seu(s) agressor(es) e, por outro, atingir o(s) adversário(s). A prática desta técnica ainda hoje se mantém em vários países estrangeiros, como por exemplo, Portugal, França, Inglaterra (quarterstaff) e também na maioria dos países orientais, principalmente na Índia, China, Japão (bo-jiutsu), Tailândia, Vietname e Afeganistão.

Como arma ofensiva e defensiva, o pau é uma forma tão simples que a etnologia, em geral, não o incluiu na categoria das «armas que se seguram com as mãos». No entanto, um bom jogador de pau não tem medo de enfrentar qualquer adversário que utilize outras armas.

Assim, coloca-se a questão de saber se o uso do pau como arma representa apenas um aspeto do seu uso como complemento de caráter geral ou se, pelo contrário, o uso do pau em geral representa uma extensão para outras funções para além daquela que era, principal e inicialmente, apenas uma arma.

No norte de Portugal (especialmente no Minho), o pau era o companheiro dos jovens vigilantes, dos viajantes ao longo dos caminhos, dos pastores no topo das montanhas; a sua função era múltipla na estrada, era uma ajuda, ora para subir as encostas, ora para descer, apoiando nela o peso do corpo; quando um riacho cortava o caminho, saltava-se apoiando-se no pau. O pastor na montanha e os comerciantes na feira apoiavam nele o seu peso, aliviando assim as pernas; até o pastor conduzia com ele o gado e, quando necessário, afugentava o lobo, tanto para sua própria defesa como para a do rebanho que lhe fora confiado; «só quando o jovem conversava com a sua noiva em frente à lareira da sua casa é que ele o largava; então o bastão ficava à porta, para indicar aos outros que não tinham razão para estar ali.» O varapau era também a arma por excelência nestas regiões; com ele resolviam-se os problemas quotidianos que provinham principalmente da rivalidade entre aldeias, de namorados, do desvio das águas de irrigação, etc.

O rapaz era considerado um jovem quando tinha o seu varapau e fazia a ronda com os outros: era como ser armado cavaleiro.

Quem em Portugal nunca ouviu falar das lutas com paus nas feiras (não só no norte, mas em todo o país), onde aldeias inteiras se enfrentavam em combates sangrentos e até mortais?

O jogo do pau fazia então parte da vida dos portugueses do norte. Por todo o lado havia escolas onde grupos de rapazes ansiosos por aprender se reuniam à volta de antigos mestres que cobravam caro pelas suas aulas. Cada país enviava os seus filhos a esses mestres para aprenderem esta disciplina que fazia parte da sua educação; tal era a importância dada ao jogo do bastão naquela época.

Normalmente, durante as longas noites de verão, viam-se nos terrenos (1) grupos de jovens a praticar as suas habilidades desportivas na manipulação da vara de treino, muitas vezes prolongado-se quase até ao amanhecer.

Na verdade, por volta dos anos 30, o jogo do pau no norte entrou em declínio. As razões para essa ruptura foram variadas e intimamente interligadas: devido a tantas lutas nas feiras, a intervenção das autoridades policiais fez-se sentir, proibindo o uso do pau nos recintos da feira. Também a emigração para o estrangeiro e a migração para as grandes cidades, geralmente feita pelo chefe de família que não conseguia subsistir da terra que cultivava, trouxe-nos uma grande fraqueza, pois poderíamos ser os futuros «puxadores» (nome pelo qual eram designados os jogadores do norte).

Por outro lado, a facilidade de aquisição de armas de fogo também contribuiu para a «desnecessidade» do jogo do pau, pois a justiça pessoal feita pela «vara» exigia um treino bastante lento para que alguém pudesse realmente confiar na eficácia da sua arma.

Assim, por estas e outras razões de menor importância, esta arte de combate do norte de Portugal foi reduzida, deixando a representação apenas a pequenas escolas onde pequenos grupos de antigos jogadores treinavam apenas para jogos de exibição, onde antigos mestres preparavam uma mão cheia de crianças também com o mesmo objetivo de demonstração.

Entretanto, o jogo do pau também sofreu uma migração significativa. Partindo do seu núcleo original no Minho, com paragem em Trás-os-Montes, sai a grande velocidade, passa pela capital, atravessa o Tejo e vai fixar-se na zona sul, principalmente na Estremadura e no Ribatejo.

Nesta viagem, cresceu graças às mãos dos vários mestres profissionais que percorriam o país fazendo estágios em várias localidades, sendo os mais famosos o mestre Calado Campos, pai e filho, mais conhecidos por «pretos», que ensinavam desde o Minho até Setúbal. O mestre Joaquim Bau, extremamente profissional, também era conhecido no mundo da jogo do pau, sempre montado na sua mula, percorria Portugal vivendo sozinho e simplesmente das doações que recebia em troca das aulas que dava.

Da mesma forma, os jeireiros [trabalhadores pago ao dia] vindos do Minho e de Trás-os-Montes para realizar trabalhos temporários no sul do país foram os grandes responsáveis pela transmissão do jogo do pau nessa região.

Foi a partir do final do século passado que o jogo do pau se propagou até Lisboa, onde se estabeleceu.

Na cidade, em condições muito diferentes das da província, o espírito do jogo do pau alterou-se. Libertado dos imperativos de luta que o acompanhavam nas suas origens, na época e na região, vemos agora que se vira para o aspeto desportivo.

Os primeiros ginásios onde se iniciou a prática desta nova disciplina foram: o Real Ginásio, o atual Ginásio Clube Português, o Ateneu Comercial de Lisboa e o Lisboa Ginásio Clube. Para além destes centros, existiam ainda os chamados «Quintais», que eram recintos rodeados por um muro, sendo a prática do jogo feita no pátio interior. Os «Quintais» encontravam-se espalhados por toda a cidade de Lisboa e neles treinavam centenas de jogadores que recebiam as lições de um mestre ou de um contra-mestre de escola (estilo) que eles próprios escolhiam.

Esses famosos «Quintais» não eram, como muitos burgueses supunham, frequentados por pessoas briguentas, nem por criaturas de má índole. Os trabalhadores, na sua maioria de Trás-os-Montes, do Minho e de outras províncias nortenhas, tinham um gosto especial por este exercício, que era praticado com admiração nas suas terras natais. O entusiasmo destes homens era sempre grande na sua aprendizagem, porque apreciavam o ensino e sabiam valorizar o sacrifício que faziam para pagar; apenas dez minutos de aula correspondiam, naquela época, ao salário diário de um trabalhador.

É fácil compreender que um homem que, por vezes, não ganhava mais do que quatrocentos reis por dia, extraindo pedra de uma pedreira, ou quinhentos e seiscentos reis por dia noutra profissão extenuante, não ia pagar ao mestre por snobismo.

Da mesma forma, aqui em Lisboa, o apogeu desta arte durou pouco tempo devido a múltiplos fatores, tais como o desenvolvimento de novos desportos trazidos do estrangeiro e que, por outro lado, estavam na moda. As gerações mais novas foram cativadas por esta novidade, deixando um vazio de uma geração e, se não fosse mantido com carinho nas mãos de jovens apaixonados, o jogo do pau (que hoje renasce com grande entusiasmo em homenagem aos tempos heróicos dos antigos «puxadores») veria a sua existência em perigo, sendo que não havia praticamente nada escrito sobre o assunto, uma vez que toda a técnica era transmitida oralmente.

Estudo particularmente interessante.

O aluno senta-se numa cadeira, o professor fica de frente para ele e ataca-o de todos os ângulos... dada a velocidade e a força dos golpes, o melhor é bloquear...


II - A TÉCNICA PORTUGUESA PROPRIAMENTE DITA

O jogo do pau que se pratica hoje em Portugal é a evolução do antigo jogo do Minho, tecnicamente menos rico e que se caracterizava sobretudo pela manipulação da «vara» pelo meio com as duas mãos afastadas, de forma semelhante à técnica que ainda hoje se utiliza em vários países orientais.

A nossa técnica atual evoluiu no sentido de aproveitar ao máximo o comprimento e, consequentemente, o alcance da vara, de modo que esta era agarrada numa das extremidades com uma só mão ou com as duas mãos quase juntas. Além disso, e também como resultado do aumento do comprimento da «vara», a técnica passou a basear-se na rotação da mesma, o que se traduziu não só numa maior rapidez e potência de ataque, mas também nos permitiu uma maior maleabilidade e eficácia no combate contra diferentes adversários.

Também foram criadas novas defesas adequadas a este tipo de manuseamento. É importante notar que esta evolução do jogo do Minho, que ocorreu num período relativamente curto e resultou de um estudo feito propositadamente ou da necessidade de enfrentar diversas circunstâncias de combate real, não teve interferências externas durante esses anos de evolução, mas desenrolou-se sim no interior do próprio país, o que comprova a afirmação do mestre Frederico Hopffer, no seu livro (Duas Palavras Sobre o Jogo de Pau), quando diz que, de todas as atividades físicas praticadas em Portugal, esta é certamente a mais puramente portuguesa.

O Jogo do Pau atual divide-se em duas grandes escolas que, por sua vez, se subdividem em diferentes «estilos», de acordo com as diversas regiões e a habilidade própria de cada um dos mestres ou jogadores.

Estas duas grandes escolas, situadas em zonas geográficas diferentes, eram chamadas: A ESCOLA DO NORTE E A ESCOLA DE LISBOA.

A Escola do Norte tinha uma forma predominante de jogo de combate, mais dura e grosseira e com características sobretudo rurais, o que a tornava verdadeiramente proveniente do Jogo do Pau português.

Tecnicamente, caracterizava-se por um jogo, sobretudo com as duas mãos, quase sempre aproveitado pela rotação do pau, ora no ataque, ora na defesa (guardas em movimento). É um jogo de curta distância, mas com uma manobrabilidade surpreendente em todas as direções, ideal sobretudo no combate contra vários adversários.

É chamado de jogo de feira ou «varrimento». Aqui, todo o treino é orientado no sentido de facilitar as diversas circunstâncias do combate real contra uma variedade de adversários.

Em «Fafe», terra das grandes tradições do Jogo do Pau (basta lembrar a temida «Justiça de Fafe», cujo símbolo da execução da justiça é representado por uma grande vara), além de toda essa fonte técnica, ainda se conservava um tipo de jogo muito antigo (descendente direto do antigo jogo do Minho). Este tipo de jogo só é utilizado no combate um a um, não produzindo qualquer efeito quando utilizado contra mais do que um adversário. Tanto que havia nessa técnica um desperdício de espaço e de potência das possibilidades de ataque com o modelo atual do pau, isso porque aqui ele era mantido no meio pelas duas mãos afastadas (desperdício de distância) e os ataques eram feitos diretamente e não em rotação (desperdício de potência), não para respeitar as defesas, mas, pelo contrário, porque também efetuados diretamente e usados com a força dos braços e do corpo juntos, permitem maior rapidez e certeza na sua execução. Por outro lado, esta técnica é francamente eficaz em combate quando a distância é muito mais curta. Nos tempos áureos do jogo do norte, o qual consistia em «matar», bastava observar as regras e usar todos os meios e golpes, sendo o domínio apenas a melhor garantia de vitória.

Às vezes, nessas lutas «para matar», o pau era equipado numa das extremidades com uma lâmina ou uma ponta de lança coberta por uma tampa de metal que era removida quando a luta estava prestes a começar. Às vezes, em vez dessa lâmina, usava-se uma pequena foice (a foice dourada), que era um instrumento usado pelo homem do campo principalmente para cortar silvas e outras ervas daninhas, e que se encaixava no pau no meio da sua extremidade oca, servindo também para esses fins bélicos.

Entretanto, existia também uma espécie de «código tático» que os bons jogadores utilizavam e, de um modo geral, as pessoas bem informadas não ignoravam o próprio valor do jogo: não se atacava o inimigo que não levava um pau. Quintas Neves mostra a «manilha» jogando a vara no chão depois de desarmar e desmoralizar totalmente três adversários que o atacaram no caminho. E ouvimos a história de um grande jogador do Porto, Carvalho, comerciante de gado, que na feira do «26» em Angueja, perto de Aveiro, depois de ter resistido sozinho contra todos aqueles que se tinham unido contra ele, tropeçou e caiu no chão, tendo então o mais forte dos seus adversários ido sobre ele, avisando os outros a não tocarem no valente ou teriam também de lutar com ele.

A escola chamada de Lisboa engloba não só a técnica de jogo do pau praticada na capital portuguesa, mas também a utilizada no Ribatejo (1) e no resto da Estremadura. Nesta zona do sul predominou durante muitos anos o jogo desportivo e o «assalto» de exibição.

Ao contrário do jogo do norte, no qual o jogador se preparava principalmente para enfrentar diferentes adversários, o jogo de Lisboa, com as suas características desportivas, cultivava o que se chamava de «contra-jogo», em que apenas dois adversários se enfrentavam.

Esta escola é uma modificação relativamente recente da Escola do Norte, adaptada para o combate um a um, que atingiu o seu apogeu no início deste século, em Lisboa, com o grande mestre Frederico Hopffer, que estudou e codificou a sua técnica. Diferenciava-se do contra-jogo da Escola do Norte principalmente pela coordenação do trabalho das pernas e da «vara», enquanto esta última se baseia fundamentalmente no manejar da «vara», sendo o movimento das pernas particularmente dependente desse mesmo manejo. Para além desta diferença fundamental, devemos então destacar os ataques que são executados principalmente com uma só mão, facto que contribui para um alcance ainda maior devido ao comprimento; as defesas (mais familiarmente chamadas de coberturas) que são efetuadas diretamente e não aproveitadas pela rotação do pau, e também o uso dos «cortes» (golpes destinados a prejudicar ativamente o efeito de outro golpe que não é considerado uma guarda) é uma técnica revolucionária que faz parte da fase avançada das escolas de Lisboa.